Este artigo analisa, de forma prática e atualizada, três áreas fundamentais da proteção jurídica das crianças expatriadas em Portugal: responsabilidades parentais, acesso à educação e saúde, e o enquadramento legal em situações de separação com elementos internacionais.
1. Responsabilidades parentais: um regime centrado no superior interesse da criança
Em Portugal, o conceito de responsabilidades parentais substituiu a antiga noção de “poder paternal”, refletindo uma abordagem mais moderna e centrada na proteção integral da criança. Este regime aplica-se a todas as crianças residentes no território nacional, independentemente da nacionalidade dos progenitores ou do seu estatuto migratório.
A regra geral é a de que ambos os pais partilham as responsabilidades parentais, mesmo após uma separação ou divórcio. Assim, decisões estruturantes na vida da criança – como a definição da residência habitual, a escolha do estabelecimento de ensino, a submissão a tratamentos médicos ou eventuais deslocações internacionais – devem ser tomadas por mútuo acordo.
Na ausência de consenso, qualquer dos progenitores poderá recorrer ao tribunal. As decisões judiciais são sempre norteadas pelo superior interesse da criança, atendendo, entre outros critérios, à estabilidade emocional, à manutenção de vínculos afetivos significativos e à capacidade de cada progenitor para assegurar os cuidados necessários.
2. Educação e saúde: direitos garantidos a todas as crianças residentes
O ordenamento jurídico português garante o direito de acesso à educação e à saúde a todas as crianças residentes, independentemente da sua origem.
O ensino público é gratuito até ao final do ensino secundário, e muitas escolas oferecem programas de apoio à integração linguística e curricular para crianças que ainda não dominam a língua portuguesa, em articulação com o Ministério da Educação. Para além do ensino público, existem também diversas escolas internacionais e privadas que seguem currículos estrangeiros, o que constitui uma alternativa válida para famílias que pretendem manter uma continuidade no percurso educativo global dos seus filhos.
Relativamente à saúde, o Serviço Nacional de Saúde (SNS) assegura o acesso universal aos cuidados de saúde, com isenção de taxas moderadoras para menores de 18 anos. O registo num centro de saúde local e a atribuição de um número de utente são indispensáveis para usufruir de cuidados pediátricos, vacinação e consultas de rotina.
3. Separação com elementos internacionais: regras de competência e reconhecimento de decisões
Em contextos de separação em que existam elementos internacionais – como a residência de um dos pais noutro país ou casamentos celebrados no estrangeiro – podem surgir questões complexas relacionadas com a competência dos tribunais e com a lei aplicável.
Portugal é parte em diversos instrumentos internacionais que regulam estas matérias, designadamente:
o Regulamento (UE) 2019/1111 do Conselho, de 25 de junho de 2019 (Regulamento Bruxelas II-B), aplicável entre Estados-Membros da União Europeia, que estabelece regras sobre competência, reconhecimento e execução de decisões relativas a responsabilidades parentais e dissolução do vínculo conjugal;
e a Convenção da Haia de 1980 sobre os Aspetos Civis do Rapto Internacional de Crianças, que visa prevenir e remediar deslocações ou retenções ilícitas de menores no estrangeiro.
Estes mecanismos facilitam o reconhecimento mútuo de decisões judiciais entre países e permitem, em muitos casos, assegurar a proteção efetiva da criança em cenários transfronteiriços. No entanto, a sua aplicação prática pode implicar desafios adicionais, sendo aconselhável recorrer a acompanhamento jurídico especializado, sobretudo em matérias como autorizações de residência, mudanças internacionais com menores ou pedidos de regresso ao país de residência habitual.
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por Andreia Morgado Duarte - Associada Sénior , da Sociedade de Advogados CCA.