O novo governo britânico tomou posse há cerca de um mês, com uma maioria considerável,apesar de ter recebido apenas 34% dos votos, situação possível devido ao sistema eleitoral do país. Apenas 9% do eleitorado conhecia bem as posições do agora Primeiro-Ministro. Um líder pouco compreendido, mas que se tornou a única alternativa a um governo que estava no poder há 14 anos e se mostrava desgastado e ineficaz perante os sérios problemas que o país tem vindo a enfrentar.

Entre esses problemas, destaca-se a questão migratória, que tem gerado grandes tensões. Barcos carregados de migrantes ilegais atravessam o Canal da Mancha semanalmente, resultando em tragédias humanas, custos elevados para os contribuintes britânicos e um aumento do desconforto social no meio de uma crise económica e cultural.

Durante a campanha eleitoral, a questão migratória foi abordada, por praticamente todos os partidos, mas as soluções estruturais foram evitadas. Há um receio generalizado de discutir estas questões de forma aberta e franca, devido ao medo de rótulos e da impopularidade. Quando deixamos de discutir problemas sérios, eles crescem até se tornarem catastróficos.

Todos os assuntos devem ser discutidos abertamente, de forma séria e respeitosa. Os políticos têm a obrigação de ouvir as inquietações do povo, já que o serviço público é o fundamento da sua existência. Quando os cidadãos começam a expressar o seu descontentamento, seja de forma correta ou desordeira, e a resposta do governo é suprimir a liberdade de expressão com censura, prisão e ameaças, algo está profundamente errado. Em vez de buscar a ordem através do medo, os líderes deveriam procurar soluções que atendam às necessidades da população que os elegeu.

No Reino Unido, a terra de grandes defensores da liberdade, pessoas de todas as idades estão a ser criminalizadas pelo que escrevem nas redes sociais, sob a acusação de "incitamento ao ódio". A acusação de “discurso de ódio" tem sido usado de forma tão arbitrária que qualquer crítica ou protesto pode ser enquadrado nessa categoria, transformando-se naquilo que o governo quiser que seja.

Esta situação lembra perigosamente os caminhos totalitários que Orwell nos parecia tentar avisar no seu “1984”.

Portugal não deve ignorar este alerta. A liberdade de expressão é um dos pilares fundamentais de uma democracia saudável, e a sua limitação é sempre um sintoma de autoritarismo.

Que a memória histórica dos Portugueses perdure quando os exemplos internacionais não parecem suficientes para lembrar que a liberdade de expressão não é garantida e a sua limitação é sempre um sintoma negativo numa democracia: Durante o Estado Novo, ao abrigo do decreto de lei n.º 12 008 de 1926 era proibida a venda ou divulgação de informação, que contivesse boato ou informação capaz de perturbar o espírito público ou causar prejuízo ao Estado”. Parece que Salazar só falhou no campo da semântica, se eventualmente tivesse resumido tudo isto ao virtuoso nome de “discurso de ódio” passaria à História como uma censura aceitável.

Hoje, a União Europeia ao abrigo do seu DSA, tem dado passos importantes na limitação da liberdade de expressão, tão subtis e pouco conhecidos do público em geral, que só tomamos consciência da sua existência quando somos convidados a repensar sobre o que estamos a postar nas redes sociais do grupo META, ou quando o TIK TOK retira um vídeo do ar por alegadas informações falsas.

O alerta para Portugal vem da observação de que como membro da UE, sujeito ao DSA, que já representa uma forte força regulatória, Os apelos por regulação das redes sociais têm-se tornado ainda assim frequentes:

As palavras do ex-Presidente da Assembleia da República, Santos Silva, de que "as redes sociais estão a enfraquecer as instituições" devem soar como um aviso. Se a liberdade de expressão tem limites, então não é verdadeira liberdade. Nenhum governo tem o direito de interferir no pensamento individual, mas pode certamente silenciá-lo através da própria legislação como está a fazer o governo britânico.

Quando o povo está em silêncio, perde a capacidade de união e protesto, tornando-se submisso às ações governamentais, por mais draconianas que sejam.

A regulação das redes sociais é inaceitável em sociedades democráticas. Estas plataformas são propriedades privadas com regras próprias, e qualquer vítima de crime cibernético tem à disposição os meios legais para buscar justiça. O que não se pode aceitar é a penalização por delito de opinião.

Portugal não pode repetir os erros do Reino Unido. É essencial conhecer bem os nossos políticos e aquilo que defendem e que os nossos governantes e a sociedade defendam com firmeza a liberdade de expressão. Devemos rejeitar qualquer tentativa de censura disfarçada, independentemente de quão bem-intencionada possa parecer. É hora de exigir transparência, de promover os debates abertos, sobretudo os mais difíceis, e de garantir que todas as vozes sejam ouvidas, sem medo de represálias.

A história mostrou-nos que a censura, independentemente do nome que lhe damos, nunca traz estabilidade, apenas silencia as discordâncias, adia problemas que eventualmente irão ressurgir de forma agravada.


Author

Cláudia Nunes - Presidente of LOLA Portugal | Fellow Young Voices Europe."

Cláudia Nunes